BRASÍLIA, 20 de março de 2024 – Os investidores estrangeiros retiraram 694 milhões de reais da B3 no pregão da última sexta (15), o 10° dia consecutivo de saída do capital externo da bolsa brasileira.
Trata-se da intensificação de uma tendência observada desde o início do ano: no acumulado de 2024, o fluxo de investimento estrangeiro está negativo em 24,16 bilhões de reais. O movimento vai na contramão do final do ano passado, quando a bolsa registrou ingresso de 17,5 bilhões de dólares em dezembro e saldo positivo de 44,9 bilhões no acumulado de 2023.
A explicação vem dos Estados Unidos. Por lá, a data para o início dos cortes de juros ainda é incerta. No início desta semana, o dado de inflação mais forte do que o esperado, a 3,2% ao ano, renovou os temores de que a batalha do Fed contra a inflação ainda não tenha acabado – e que o afrouxamento monetário pode demorar a chegar. Contam também declarações de dirigentes do Fed indicando uma postura mais cautelosa em relação à inflação.
Para a reunião do FOMC (o comitê de política monetária dos EUA) desta semana, 99% dos agentes de mercado acreditam que os juros serão mantidos no atual intervalo de 5,25%–5,50%, segundo dados do FedWatch. É um recálculo de rota em relação ao início do ano, quando quase 70% dos investidores apostavam em um primeiro corte de juros já em março. Agora, a maioria (55,5%) do mercado acredita que a primeira redução de 0,25p.p virá em junho.
Os juros americanos estão em seu patamar mais elevado em 23 anos, o que aumenta a atratividade dos títulos públicos do país, os Treasuries. Com apostas renovadas sobre o início dos cortes, a procura pelos papéis voltou a crescer nos últimos meses. Na manhã desta segunda-feira, 18, os títulos com prazo de 10 anos, referência do mercado, são negociados com taxa de 4,3% – no início do ano, o patamar era de 3,8%.
Treasuries com rentabilidade alta reduzem a atratividade de investimentos em renda variável, em especial em países emergentes, mais arriscados. “Treasuries americanos são considerados praticamente livres de risco, por isso, eles acabam atraindo o capital”, explica Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.
Paulo Abreu, gestor e sócio da Mantaro Capital, aponta também para um movimento de correção após a forte entrega de investimento no Brasil no fim do ano passado – entre novembro e dezembro, o Ibovespa registrou avanço de 19%, puxado principalmente pelo otimismo com a queda dos juros nos EUA. “A outperformance pode ter desencadeado uma leve redução de riscos no primeiro momento desde ano”, diz Paulo.
Efeito no câmbio
A saída de investimento estrangeiro possui um impacto direto no câmbio. “Isso tende a desvalorizar a nossa moeda, já que passamos a ter uma menor entrada de dólares circulando no país”, explica Cristiane Quartaroli, economista do Ouribank. Em fevereiro, o fluxo cambial divulgado pelo BC (que concentra dados do setor financeiro e comercial) registrou saída de 2,12 bilhões de dólares em fevereiro, o pior desempenho para este mês desde 2020. O resultado negativo foi puxado pela saída de 4,85 bilhões do setor financeiro.
Mas os analistas apontam que este se trata de um “movimento pontual de ajuste” na bolsa brasileira. “O Brasil segue sendo bastante atrativo entre os emergentes, ele é um país muito grande com uma liquidez muito boa, e isso atrai os olhares dos investidores estrangeiros”, diz Moliterno, da Veedha Investimentos.