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Necessárias, mas insuficientes: por que as reformas não elevaram a produtividade do país

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Produtividade na indústria está no nível mais baixo desde o início da pandemia, aponta a CNI. | Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

Uma série de reformas micro e macroeconômicas foram implantadas desde 2016, como a reforma trabalhista, a da Previdência e um conjunto de medidas para melhorar a eficiência do mercado de crédito, como redução de recursos com taxas subsidiadas, mudanças no cadastro positivo, criação da duplicata eletrônica e implantação do Pix e do open banking. O Congresso aprovou ainda a mudança do marco regulatório do saneamento em 2020 e a autonomia do Banco Central em 2021.

Os impactos na economia, porém, foram discretos até agora. Dados do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, da Fundação Getulio Vargas (FGV), mostram que, no terceiro trimestre de 2021, a produtividade por pessoal ocupado estava nos mesmos níveis do segundo trimestre de 2018. A produtividade por hora efetivamente trabalhada, por sua vez, estava no mesmo patamar do segundo trimestre de 2017.

“Este novo conjunto de reformas [feitas a partir de 2016] justifica certo otimismo em relação a uma aceleração do crescimento da produtividade. Nesse sentido, é surpreendente que a produtividade tenha caído em 2019. Embora tenha havido um aumento expressivo em 2020, ele refletiu principalmente o fato de que a pandemia afetou mais os setores e trabalhadores menos produtivos”, disse, em artigo, o pesquisador Fernando Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, que recentemente publicou dois textos sobre a questão.

Reformas são condições necessárias, mas nem sempre suficientes

Veloso afirma que, “embora reformas sejam condições necessárias para o aumento da produtividade, elas nem sempre são suficientes”. Em artigo, o pesquisador da FGV apontou que um fator fundamental para o efeito positivo de reformas anteriores foi a “continuidade de uma política econômica responsável sob o ponto de vista fiscal”, que, segundo ele, contribuiu para reduzir o grau de incerteza e viabilizar o investimento de longo prazo.

Outro fator que, de acordo com Veloso, contribui para o impacto positivo das reformas é o cenário externo favorável. É o que aconteceu no fim dos anos 1960, após o Programa de Ação Econômica do Governo (Paeg), que teve papel importante para explicar o “milagre econômico” de 1968 a 1973, e também após o Plano Real, lançado em 1994.

O pesquisador lembra que esse quadro internacional positivo possibilitou que empresas produtivas pudessem aproveitar os ganhos de eficiência propiciados pelas reformas e expandir sua participação no mercado.

É um quadro que não existe hoje. “De um lado, o cenário externo parece cada vez mais desfavorável com a iminência de elevação das taxas de juros internacionais. No lado doméstico, os problemas fiscais e as turbulências políticas, agravadas pela polarização do cenário eleitoral, contribuem para que a incerteza permaneça num patamar muito elevado”, escreve o pesquisador. “Talvez tenhamos que esperar o próximo governo para que as reformas tenham o impacto almejado na produtividade.”

A incerteza em relação à economia permanece em níveis elevados, mesmo com uma ligeira redução nos últimos meses. Em dezembro, o indicador de incerteza calculado pela FGV ainda estava 7,2 pontos acima do registrado em fevereiro de 2020, mês anterior à explosão da pandemia da Covid-19.

Melhora na educação e reforma tributária são questões-chave

Especialistas consultados pela Gazeta do Povo mencionam duas questões-chave para a melhoria da produtividade no país: a necessidade de melhora no nível educacional e uma reforma tributária.

O governo de Jair Bolsonaro até propôs mudanças na legislação dos impostos – a fusão de PIS e Cofins na CBS e alterações no Imposto de Renda. Mas não uma reforma tributária ampla, algo que o ministro da Economia, Paulo Guedes, diz ser “impossível” de fazer, preferindo, assim, o que chama de reforma “fatiada”. Os projetos mais abrangentes em discussão no Congresso – as propostas de emenda à Constituição (PECs) 45 e 110 – são frutos de iniciativas do próprio Legislativo e não têm a simpatia do ministro.

“Não é só o problema da carga tributária que afeta a competitividade brasileira. O sistema é complexo, custoso, torna difícil pagar as obrigações e é ineficiente, pois cria distorções ao investimento”, destaca o gerente de análise industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Marcelo Azevedo.

Segundo a última edição do relatório Doing Business, publicada pelo Banco Mundial em 2020, o país tem o sétimo pior sistema de pagamento de impostos do mundo, à frente apenas de República do Congo, Bolívia, República Centro Africana, Chade, Venezuela e Somália. É, também, o país onde é gasto mais tempo para se trabalhar com questões tributárias.

“O suporte à gestão tributária é muito grande nas empresas brasileiras, o que faz com que se tenha um custo pesado de back-office”, explica o sócio-líder de manufatura industrial da KPMG no Brasil, Luiz Sávio. Ele defende a necessidade de se adotar uma lógica de simplificação tributária, de forma a tornar mais simples a decisão de investimento.

Outro desafio tem relação com o nível educacional brasileiro. Apesar de ser um dos países que mais gastam com educação – 6,3% do PIB, segundo ranking elaborado pela revista britânica “The Economist”, 13.º maior índice do mundo –, a despesa não se traduz em qualidade.

“Vários estudos mostram que o impacto de melhorias do ambiente de negócios depende do nível de escolaridade dos empreendedores e trabalhadores. Quando este nível é baixo, os benefícios das reformas, como o maior acesso a crédito associado à formalização, tendem a ser pouco significativos”, diz Veloso, da FGV.

Os especialistas apontam que essa questão ganha mais força com a implantação de novas tecnologias, como o 5G, que deve chegar a várias capitais de estados até julho, e de uma economia “mais verde”, que tem mais importância diante de um cenário de crise climática.

“Há um interesse muito grande pelas novas tecnologias por parte de executivos e empresários brasileiros. Elas ampliam os ganhos de produtividade e tornam a indústria mais resiliente às crises globais”, ressalta Sávio.

A alternativa que o Brasil tem, segundo o gerente da CNI, é o de encarar esses desafios paralelamente. “Não dá para olhar para o futuro sem enxergar os problemas do passado.”

Reformas são desidratadas no Legislativo. E dependem de outros fatores

Um problema das reformas, de acordo com o sócio da Monte Bravo Investimentos Rodrigo Franchini, é que, à medida que tramitam no Legislativo, elas são desidratadas. “Não acabam ficando a contento”, afirma.

Veloso, da FGV, faz referência aos “jabutis” colocados pelo Congresso no projeto de privatização da Eletrobras para apontar como as concessões feitas para viabilizar a aprovação de reformas podem chegar ao ponto de comprometer as próprias reformas.

Segundo ele, outra explicação para o baixo impacto das reformas recentes tem a ver com as crônicas deficiências de infraestrutura do país. Ainda que estejam sendo enfrentadas por um grande conjunto de concessões de ativos à iniciativa privada, elas ainda colocam entraves para que as empresas mais produtivas expandam seu mercado, avalia o pesquisador.

A melhoria do ambiente de negócios, em resumo, é uma agenda extensa e de longa duração. “Ela exige qualidade técnica em sua elaboração e um esforço coordenado e persistente por parte do Executivo, Legislativo, Judiciário e da sociedade para sua adequada aprovação e implementação. Também pressupõe estabilidade fiscal e política. Trata-se de um desafio difícil, porém factível, que provavelmente ficará para o próximo governo”, concluiu Veloso em um de seus textos sobre a questão da produtividade.

Os problemas de produtividade na indústria

produtividade na indústria de transformação caiu 1,3% no terceiro trimestre de 2021, comparativamente ao trimestre anterior, aponta a Confederação Nacional da Indústria (CNI). O volume produzido encolheu 1,9% e as horas trabalhadas, 0,6%,

O indicador está em queda desde o último trimestre de 2020, e retornou ao nível do segundo trimestre daquele ano, o pior momento da pandemia da Covid-19 no Brasil.

A entidade empresarial aponta que as quedas consecutivas refletem o ambiente de elevadas incertezas, prejudiciais ao investimento e à recuperação da produtividade. Azevedo afirma que também há questões de curto prazo que a afetam.

É o caso de falta de insumos e de matérias-primas, problema enfrentado por 60,6% dos industriais. O gerente da CNI aponta que a falta de matéria-prima é um problema que só parou piorar ao fim de 2021: “Ainda é muito grave e a percepção dessa falta de matérias-primas é ainda muito generalizada”.

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