ARTIGO

Estupidez endêmica

Compartilhe
É impossível descobrir ou traçar qualquer conexão lógica entre as liberdades civis e a estatização dos meios de produção

Algumas ideias espalham-se com grande sucesso não apesar de serem estúpidas, mas precisamente porque o são. A estupidez maciça exerce um poder anestésico e paralisante sobre a inteligência humana, detendo o seu movimento natural e fazendo-a girar em falso em torno de alguma crença idiota por anos, décadas ou séculos, incapaz de livrar-se do seu magnetismo perverso ou de pensar o que quer que seja fora do círculo de ferro da idiotice consagrada.
 
O exemplo mais assombroso é este:

É impossível descobrir ou traçar qualquer conexão lógica entre as liberdades civis e a estatização dos meios de produção. São esquemas não somente heterogêneos, mas antagônicos. Antagônicos lógica e materialmente.

Qualquer garoto de ginásio pode compreender isso tão logo lhe expliquem o sentido dos dois conceitos. A candura com que tantos homens adultos falam em “socialismo com liberdade” – isto quando não chegam a acreditar que essas duas coisas são a mesma, ou que uma decorre da outra com a naturalidade com que as bananas nascem das bananeiras – é a prova inequívoca de uma deficiência intelectual alarmante, que desde há um século e meio se espalha sem cessar pelas classes cultas, semicultas e incultas com a força avassaladora de uma contaminação viral, sem dar sinais de arrefecer mesmo depois que a experiência histórica comprovou, de maneira universal e repetida, aquilo que poderia ser percebido antecipadamente por mera análise lógica e sem experiência histórica alguma.

A pergunta é simples e brutal: como é possível que a centralização do poder econômico, expandindo-o automaticamente sobre toda a sociedade e investindo-o da força suplementar do aparelho repressivo do Estado, venha a torná-lo menos opressivo e tirânico do que milhares de poderes econômicos parciais e limitados, espalhados como farelo, desprovidos do poder de polícia e em perpétua concorrência uns com os outros?

Ninguém deveria precisar de mais de alguns segundos para atinar com a resposta óbvia: Não, não pode. Nem se pode negar que os próprios clássicos do “socialismo científico” tenham ajudado a tornar essa resposta ainda mais patente, quando declararam alto e bom som que o que se seguiria ao capitalismo não seria uma democracia, de qualquer tipo que fosse, e sim a ditadura do proletariado.

O que eles não explicaram jamais, nem nenhum de seus seguidores pediu jamais que o fizessem, foi como essa ditadura, uma vez vitoriosa e consolidada, poderia transmutar-se numa democracia exceto pelo método de liquidar-se a si mesma, dissolvendo o monopólio estatal e distribuindo o poder econômico entre os particulares – outra impossibilidade lógica ilustrada por uma longa e sangrenta experiência histórica que um pouco de inteligência tornaria perfeitamente dispensável.

Em suma, a fé nas virtudes libertárias do socialismo, mesmo quando tênue e matizada, é sinal de uma deficiência cognitiva grave, que se espalha como praga e se arraiga no fundo dos cérebros por virtude da própria estupidez originária que a produz e determina.

Mas, como uma vez aprisionado na idiotice o cérebro humano nada consegue conceber fora dela ou sem referência a ela, o sucesso propagandístico da ideia socialista trouxe consigo uma multidão de cretinices derivadas e secundárias, cujo poder de persuasão não se rende nem mesmo ante a evidência dos fatos mais constantes e repetidos.

Inscreva-se e não perca as notícias

Uma delas é a crença, hoje um dogma de evangelho, de que a educação universal obrigatória tem o poder de aplanar as diferenças socioeconômicas. Pois deveria ser lógico e intuitivo que, se a exigência de credenciais escolares se impõe até nas profissões mais simples e modestas, credenciais mais altas e difíceis de obter se espalharão de maneira concomitante e automática entre as profissões mais prestigiosas e rentáveis, deslocando para cima, sem alterá-lo, o quadro inteiro da estratificação social.

O sociólogo Randall Collins, no clássico estudo The Credential Society. An Historical Sociology of Education and Stratification (New York, Academic Press, 1979), demonstrou que, exceto por um curto período durante o New Deal, foi exatamente isso o que se passou nos EUA: o reino das credenciais escolares não democratizou nada, apenas instituiu, nos andares mais altos da sociedade, a república das sinecuras milionárias, corrompendo de quebra o zé-povinho ao inocular na sua mente a ambição inalcançável da ociosidade bem remunerada.

Mas, assim como toda ideia estúpida tem o condão de paralisar a intuição lógica, mais ainda ela debilita e por fim suprime a capacidade de aprender com a experiência histórica, que não é senão a longa e dolorosa demonstração indutiva daquilo que, para uma inteligência normal, já estava demonstrado antes por mera análise dos conceitos envolvidos.

Pouco importando o seu nível formal de instrução, pessoas contaminadas por essa paralisia endêmica das inteligências naufragam num oceano tão escuro e denso de erros de percepção e raciocínio que terminam incapazes de conhecer a sua própria posição na sociedade e os efeitos mais óbvios das suas próprias ações, mesmo e sobretudo quando receberam treinamento universitário em ciências sociais.

O exemplo mais óbvio é o dos sociólogos, economistas, juristas e cientistas políticos de esquerda, quando alardeiam que as universidades são o “aparato ideológico da burguesia”, construído para perpetuar a hegemonia cultural do capitalismo. Pois proclamam isso nas mesmas universidades estatais que eles próprios dominam sem a menor interferência da burguesia e nas quais toda objeção capitalista ao império do marxismo é punida com boicotes, chacotas e notas baixas, se não com o fim abrupto de uma carreira universitária.

É óbvio que essas pessoas, literalmente, não sabem onde estão nem percebem o que fazem. Estão perdidas no espaço e no tempo — o que não impede que o restante da população continue confiando nelas para que lhe expliquem como a sociedade funciona.

Compartilhe

Leia mais

NUNCA SERÃO

Lahesio Bonfim e a nulidade da direita maranhense

NUNCA SERÃO

Lahesio Bonfim e a nulidade da direita maranhense

OPINIÃO

Sem anistia! Fim da anistia! 

OPINIÃO

Sem anistia! Fim da anistia! 

OPINIÃO

Vaidade de Othelino gritou tão alto que acordou Felipe Camarão

OPINIÃO

Vaidade de Othelino gritou tão alto que acordou Felipe Camarão

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Propaganda

SEMINARIO DE FILOSOFIA

Gostaríamos de usar cookies para melhorar sua experiência.

Visite nossa página de consentimento de cookies para gerenciar suas preferências.

Conheça nossa política de privacidade.