Recentemente, precisei da ajuda de um encanador para consertar um vazamento na tampa de esgoto em frente à minha casa.
Embora eu mesmo talvez pudesse fazer o serviço — graças à gloriosa internet, é possível aprender de tudo e fazer por contra própria —, dificilmente isso seria um uso valioso do meu tempo. Prefiro me concentrar em meus afazeres profissionais — pesquisa e ensino — para então gastar parte da minha receita fazendo outras atividades mais prazerosas.
Portanto, decidi recorrer à mão-de-obra especializada fornecida pela divisão do trabalho.
Utilizando uma bem conhecida ferramenta de recomendação de serviços para separar o joio do trigo, encontrei um confiável e bem reputado encanador. Consegui marcar o serviço para a manhã seguinte.
Para encurtar a história, o encanador apareceu, olhou para a rede, viu que era um hidrante enterrado, disse algo do tipo “ah, é um daqueles“, seguido por um “eu não trouxe as ferramentas para esse tipo de serviço”, entrou na van e voltou para sua base.
Quatro horas depois, o vazamento estava consertado. E então ele me apresentou a conta, pagável imediatamente (“dinheiro ou cheque”), cobrando por um total de quatro horas de serviço: duas horas de deslocamento, a maior parte delas por causa da viagem de ida e volta para buscar as ferramentas que ele não havia trazido, e mais duas horas de serviço propriamente dito.
Quando então deixei claro que não é minha responsabilidade garantir que o encanador traga as ferramentas adequadas para o trabalho, e que por isso me opunha a ter de pagar o ultrajante valor de $85 por hora para que ele apenas dirigisse seu veículo, ele simplesmente respondeu que estava cobrando pelo seu “tempo”.
Para não criar caso (meu tempo é extremamente valioso), acabei pagando a ridícula quantia, metade dela por algo que não me trouxe valor nenhum.
Meu ponto aqui nem é o fato de que um mais um encanador licenciado e protegido pelo estado (em minha cidade, só pode exercer legalmente essa profissão regulamentada quem o estado permite via certificado ou registro em órgão profissional) extorquiu mais um consumidor. O ponto é que este encanador não era empregado de uma empresa, mas sim um autônomo — e demonstrou ser totalmente incapaz de entender o que é gerir um negócio.
Empreender é sobre criar valor
Esta incapacidade de entender o básico sobre o empreendedorismo está, infelizmente, presente em vários empreendedores, e todos nós somos prejudicados por este fato. Nosso padrão de vida fica aquém do que poderia ser. E o problema é que, ainda que eles fossem ganhar muito apenas como consequência de dar um pequeno passo na direção correta, eles não o fazem.
Embora não se possa acusá-los de ignorância (empreendedores têm mais o que fazer do que estudar a teoria do empreendedorismo, por exemplo), é triste saber que muitos empreendedores encaram seu negócio como se fosse um emprego. Trata-se de uma ideia totalmente equivocada.
Empreendedorismo não é sobre emprego, e rotular proprietários-administradores de pequenas empresas como “empregados por conta própria” é um grande desserviço para a sociedade. Serve apenas para gerar confusão.
Emprego é a atribuição de efetuar determinadas tarefas (ou produzir uma série de resultados razoavelmente padronizados) dentro de uma empresa. Quando você é um empregado, seu tempo e seu esforço são meras engrenagens dentro de um amplo e rigidamente coeso processo de produção, o qual é centralmente coordenado.
E isso em nada se assemelha a empreender e criar uma empresa própria, a qual não possui um arcabouço já determinado e não possui um processo de produção já pré-estabelecido. A questão do empreendedorismo é: você pode ofertar qualquer serviço que deseje e do jeito que quiser. Já como empregado de uma empresa, você certamente não pode fazer isso. Estas duas funções são, na prática, muito mais distintas entre si do que muitos imaginam.
Colocando em termos econômicos, empreendedorismo é sobre criar valor. E, para fazer isso, um empreendedor primeiro tem de descobrir o que os consumidores valorizam e como é possível satisfazer esses desejos. O empreendedor só ganha dinheiro se souber satisfazer, de maneira contínua, os consumidores. E o que é satisfazer? Resolver seus problemas, saciar seus desejos, tornar suas vidas mais confortáveis etc.
Se este empreendedor terá sucesso é algo que dependerá completamente dos consumidores (e também daquilo que os empreendedores concorrentes irão oferecer).
E não sobre cortar custos
Dentro de uma empresa, o valor já está estabelecido. Empresas existentes já descobriram algum tipo de posição de mercado na qual podem ganhar dinheiro — um nicho onde o valor daquilo que oferecem aos consumidores é maior do que os preços que elas cobram (caso contrário, não haveria consumidores comprando voluntariamente). E esses preços, por sua vez, são maiores que seus custos de produção.
Assim, a função de um empregado desta empresa é contribuir para o processo de produção desempenhando as tarefas que lhe foram assinaladas, e fazê-las da maneira mais barata e eficaz possível. Sua função, e a função da gerência também, é cortar custos ou mantê-los sob controle.
Percebeu a diferença? Ao passo que a função do empregado (ou do gerente) é manter os custos sob controle para que a empresa possa continuar a vender bens e serviços tendo lucro (aos preços de mercado vigentes), a função do empreendedor é descobrir como gerar valor para os consumidores e o quanto eles estão dispostos a pagar por isso. (Veja mais detalhes deste processo aqui).
Um empreendedor que se concentra apenas nos custos está, na prática, atuando como um gerente e não como um verdadeiro empreendedor de seu negócio. Concentrar nos custos é algo que funciona apenas se já houver um processo de produção estabelecido, com início e fim, e com os preços já estabelecidos pelo mercado. Por outro lado, se você é um “empregado por conta própria”, você não pode se dar ao luxo de se concentrar em cortar custos (ou mantê-los sob controle) em detrimento da criação de valor.
O encanador mencionado na história acima, por exemplo, cobrou pelo seu “tempo” (seu custo) em vez de apenas pelo valor criado (consertar o vazamento). Deixando de lado os incentivos destrutivos (“se esquecer” das ferramentas é uma ótima maneira de receber sem fazer trabalho nenhum), é extremamente improvável que eu volte a contratar seus serviços. E eu certamente não o irei recomendar a ninguém.
Em outras palavras, ele não só destruiu o valor de ter um potencial cliente fiel, como ainda perdeu a chance de ter “gratuitamente” seus serviços recomendados por mim para terceiros (algo que naturalmente ocorreria caso ele mantivesse seu cliente — eu — satisfeito).
As coisas são diferentes em uma empresa já estabelecida, a qual — se corretamente gerenciada — oferece bens e serviços padronizados de uma maneira padronizada. Nenhum empregado tem o direito de alterar o modelo de negócios de seu empregador. Tampouco tem a autorização para tal. Logo, esse tipo de infortúnio não ocorreria.
Já empreendedores, por outro lado, não apenas têm o direito de alterar um modelo de negócios, como também devem fazê-lo. Começar um negócio para fazer exatamente o mesmo que os outros empreendedores e empresas estabelecidos já estão fazendo não será nada promissor (a menos, como é o caso do encanador, que as regulamentações do governo efetivamente garantam uma reserva de mercado e afetem a concorrência). A menos que você tenha uma abordagem inovadora, as chances de você ser bem-sucedido são baixas. Quem já está no mercado já se adaptou e já moldou seus processos de produção de modo a manter seus custos por unidade produzida abaixo daqueles que você pode conseguir como um novato fazendo o mesmo.
Empreendedores fazendo empreendedorismo
Empreendedores têm de criar valor. Observe que parte da criação de valor pode ser tão simples quanto utilizar uma comunicação adequada. Se o encanador, em vez de cobrar pela hora (e, como fez esse, declarar que levou duas horas para voltar para casa para pegar as ferramentas esquecidas!), cobrasse um valor fixo ou mesmo declarasse que, do valor por hora, iria descontar o valor das horas que ele passou apenas dirigindo, eu ficaria mais satisfeito com o serviço.
Ainda melhor, se ele tivesse declarado, no momento da contratação, que iria cobrar um determinado preço por esse tipo de serviço, eu já me comprometeria a pagá-lo. Em vez disso, ele — e, presumivelmente, a maioria dos outros encanadores — tratou seu negócio como se fosse um emprego: não fez nada de diferente, cobrou o mesmo, e se concentrou em cobrar do consumidor pelo seu custo (e não pelo valor fornecido).
Em setores regulados pelo estado e pouco inovadores, empreendedores não-empreendedoriais conseguem ganhar muito dinheiro independentemente de estarem ou não criando valor para seus consumidores. E dado que basicamente nenhum deles pensa como empreendedores, os consumidores têm de arcar com preços ultrajantes em troca de serviços de baixo valor. Mas tudo o que é necessário para abalar esse mercado é surgir um empreendedor inovador que implemente um modelo de negócios diferente daquele que todo o resto usa.
Para fazer isso, o empreendedor inovador tem de pensar diferente. Ele deve colocar a satisfação do consumidor em primeiro lugar — e então, só então, ajustar seus custos ao valor fornecido. E não o contrário. Concentrar-se nos custos para então “cobrar” dos consumidores um preço baseado nestes custos significa perder muitos clientes futuros. Mais ainda: significa abrir mão de muito dinheiro. E este dinheiro beneficiaria tanto o empreendedor que sabe criar valor quanto seus clientes satisfeitos com esse valor criado.
Afinal, é isso que empreendedores genuínos fazem: criam valor.
Conclusão
São os gerentes e administradores que têm a função de manter os custos baixos enquanto produzem algo de valor já estabelecido pelo mercado. Empreendedores e gerentes são cruciais em uma economia de mercado, e contribuem enormemente para o nosso padrão de vida.
Exatamente por isso, um empreendedor iniciante não pode pegar um atalho direto para as funções administrativas e esperar milagres, pois isso resultaria em apenas mais do mesmo. O empreendedor, na melhor das hipóteses, irá auferir ganhos normais. Já a sociedade como um todo terá apenas um crescimento econômico marginal.
E é isso o que acontece quando o empreendedorismo é feito muito mais por necessidade do que pela identificação de oportunidades. Ele acaba sendo rudimentar. Quem vira empreendedor apenas porque está desempregado e quer sobreviver dificilmente conseguirá um êxito prolongado, pois inevitavelmente ainda carregará a “mentalidade do empregado”.
Empreendedorismo é sobre criar valor para os consumidores, e não sobre ter uma renda mensal garantida.