
BRASIL, 20 de agosto de 2025 – Para cada duas famílias que recebem o Bolsa Família, uma sai da força de trabalho. A conclusão, de pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), comprova um efeito colateral da forte expansão do programa nos últimos anos: ele passou a desestimular a busca por emprego formal.
O Bolsa Família se agigantou desde a pandemia: o valor médio mais que triplicado e o número de famílias atendidas tiveram forte aumento. Uma das consequências é a redução da oferta de mão de obra. Com mais dinheiro vindo do governo, parte dos beneficiários não está interessada em emprego com carteira assinada.
Essa influência do Bolsa Família sobre a oferta de mão de obra ocorre em meio ao cenário de aquecimento do mercado de trabalho, ainda que as contratações estejam subindo em ritmo mais moderado.
A taxa de desemprego em junho foi de 5,8%, a menor da série histórica, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse índice reflete a fração da força de trabalho que está em busca de ocupação.
Ao mesmo tempo, a taxa de participação das maiores pessoas de 14 anos na força de trabalho ainda não voltou aos níveis anteriores à pandemia da Covid-19, em 2020. Em dezembro de 2019, 63,4% dos brasileiros em idade ativa trabalhavam ou procuravam emprego. Em junho de 2025, esse índice era de 62,4%.
O Bolsa Família passou por uma transformação radical desde a pandemia. De um auxílio modesto, tornou-se um programa de R$ 170 bilhões anuais. Essa expansão trouxe benefícios sociais, mas também revelou um “custo oculto”: a redução da participação no mercado de trabalho, especialmente entre jovens homens das regiões Norte e Nordeste.
O problema maior está no Nordeste. A taxa de participação, que era de 56% no último trimestre de 2019, ficou em 54,1% no primeiro trimestre deste ano. A única região que teve um avanço – e, mesmo assim, considerada marginal pelos economistas – foi o Sul, onde a participação no mercado de trabalho passou de 66,8% para 66,9% no mesmo período.
DO AUXÍLIO MODESTO AO ORÇAMENTO DE R$ 170 BILHÕES
A transformação do Bolsa Família começou em 2020, no governo de Jair Bolsonaro (PL), com a instituição do Auxílio Emergencial, que se consolidou no Auxílio Brasil. Os valores pagos por família saltaram de uma média de R$ 190 ao mês em 2019 para R$ 600.
Em 2023, com a posse de Lula (PT), o nome original foi retomado. Houve uma redesenho nos benefícios, e o valor médio chegou aos atuais R$ 670 — um aumento de 253% em relação a 2019. O número de famílias atendidas passou de 14 milhões para 21 milhões desde 2017. E o orçamento disparou de R$ 35 bilhões para R$ 170 bilhões.
A LÓGICA ECONÔMICA POR TRÁS DA INFORMALIDADE
O desincentivo ao trabalho formal tem lógica econômica do ponto de vista dos beneficiários. A renda garantida do Bolsa Família muitas vezes supera a perspectiva de ganhos no trabalho formal, naturalmente menos segura.
Mesmo com uma “regra de proteção” — que permite manter 50% do benefício por dois anos após a formalização —, a conta fecha precisa para o trabalhador. O emprego formal deve compensar não apenas uma perda parcial do benefício, mas também eventuais rendimentos informais já existentes.
Bolsa Família: o risco para o capital humano no longo prazo
O dilema é particularmente crítico para os jovens, que perdem oportunidades de aprendizado e experiência profissional, fatores decisivos para a formação do capital humano.
Segundo Fernando de Holanda Barbosa Filho, também do FGV Ibre, o atual Bolsa Família é “muito diferente do original”, e questões sobre seus efeitos negativos no mercado de trabalho, outras “pacificadas”, voltaram ao centro do debate.







